quarta-feira, 31 de outubro de 2012

BERNARDO DESESPERADO



Se foi... Voou o nosso amor
Para a cabeça das colcheias
Da canção que já não soa,
Porque nós é que somos os músicos,
E recusamo-nos continuar.

Foi embora... Esbarrou na janela,
Deu a volta em nossa sala com inocência,
Entristeceu-se com a penúria do meu choro
E escorreu pela saída de emergência.

Fomos felizes até o final da linha...
Mas, será o fim da linha esta linha que escrevo
Ou a linha do meu vestido?
Alinhave-se em mim,
Se a vida permitir eu costuro!

Porém, enquanto não encontramos a agulha,
Pegue tuas ferramentas,
Aperte teus botões!
Creio teus parafusos estarem frouxos!

E pudera eu pensar infeliz defeito,
Pois a criança que tu fora um dia
Sumiu com a rapidez de quando alguém apaga uma lâmpada
E logo acende para procurar algo.
– Onde está? Não sei!

Tua sensibilidade foi embora.
És agora mais um na classe do proletariado...
E te exploram e devoram!
Tu? Aperta botões!

Tornaste uma máquina.
O que não é tão ruim pelos meus cálculos românticos:
Por teres muito o que produzir
Nem tens tempo de sentir minha falta!

Por isso e por tudo e por tantos alguns “alguéns”
É que decido salvar o que ainda me resta,
Pois tua locomotiva de mil engrenagens
Não assimila o amor...

E de tanto não compreender
Ou esquecer que compreende,
Meu amor fora triturado
Derretido, soldado, lustrado,

Embalado, encaixotado e transportado
Para bem longe de tu,
Que outrora soube amar e fazer do nosso amor
Algo um pouco mais belo que oficinas.

Mas eu não sofro
E até compreendo:
Talvez o sacrifício por um amor imenso
Não seja tão doce quanto a tua fábrica!