segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

PRELÚDIO

O que no princípio me ofereceste
Sem dó nem culpa,
Em face à brutalidade,
Enriqueceu-me a inspiração.

Sabes que a dor não me é estranha!

Me é carcereira até que eu,
Faminta de ritmo e inescrupuloso sentimento,
Despeje no papel as notas da poesia que me enolve!

Eu pedi-te dolências
E tu supriste meu clamor com deveras maestria,
Mesmo que involuntariamente! Mas de toda maneira...
Qual forma de crueldade é a tu desconhecida?

Então com clemência, repouse teu pensar em minha inquietação:
Eu tenho as palavras para me libertar...
Mas o que tem como fuga
Quem vorazmente agora o espera?

sábado, 10 de dezembro de 2011

CONFLITO


I



Foi-me dado o dever
Foi-me dado o entusiasmo
A fome, a comida, a sede, a vã bebida
O problema, o desatar do laço.



A saudade, o teu abraço
O drama, o meu juízo
O choro, a caminhada
A risada na loucura!


Foi-me dada a confiança
Mas aliança foi quebrada
Do riso fez-se lágrima
E a incumbência foi-me dada.



Segurei forte a porta
De tão intimada dei resposta
Escorria na face a ira
De não ter escrito a lira que me foi imposta.



O medo dos livros emergia!
Sim, dos livros! Das letras, das linhas que não li.
Qual daquelas cairia no tecer dos fios?
O fio quebraria se tal desatino acontecesse!


Ah... mais belo seria se eu vivesse,
Se não precisasse ter posto à prova
De que meu saber vale algo,
Porque se não vale, o que vale?



Mas a dor tem que passar na linha
E o sepulcro não é sinônimo de lástima
Por isso, se eu perder-me no dicionário,
Perdoem minha falta de disciplina.



Deem um grito na vizinhança
Que minha mão foi pelo caminho errado,
Para que conheçam-me logo pelo o que sou
Pelo o que faço, e vejam o quanto meu lápis é traiçoeiro.


II



Quando eu caí em desespero
Minha irmã sorveu em calmaria
Toda a intensidade do pulsar de minhas veias,
As insanidades de hoje, de ontem...


Mas o meu surto é breve,
Não nascendo do que é concreto
Logo desmancha-se em lucidez
O que penso ser constante.


Se meus sentimentos outrora
Encontravam-se à margem da psicose,
É que sou humana e insensata,
Por vezes incapaz de distinguir o que me corrompe.


Uma voz doce convidou-me a nascer
No princípio de uma noite,
E devaneando entre o ócio e o trabalho
Eu arquejei em vida o deleite!


Fui dar-me com o outro!
É... Aquele outro lado da vida,
Onde o ponto do tecido é fechado
E mantém submerso o que é puro


Enquanto meu pano velho se regenera
Irei desfrutar deste que é novo,
O livro que estive a usar agora faz companhia
Aos outros que optei por não ler.


III


Não! Os rostos que vi eram desconhecidos
O suor que escorreu em meus braços
Entregou a aflição do pesadelo
Que de mim tentou sucumbir.


Oh mestres, perdoem minha falta de fé
Em teus filhos... Eles são sujos!
Porém vejam, estou de volta à imundície!
Nada consigo aproveitar se não a lama do que não aprendi.


O tecido que fiei
Já não mais é digno de atenção,
Já não apara, retém nem escoa,
Nisso, sinto-me mais incipiente do que antes...


Mas para provar que sou pesquisadora incansável:
Deuses todos, da língua e da expressão,
Que não me falte o léxico
Nem o poder de persuadir!